DIREITOS ESPECÍFICOS NA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA: DOS FILHOS, AINDA NÃO CONCEBIDOS, DE PESSOAS INDICADAS PELO TESTADOR, DESDE QUE VIVAS ESTAS AO ABRIR-SE A SUCESSÃO

O art. 1.799 do Código Civil, traz as hipóteses de legitimidade especial aplicáveis à sucessão testamentária. O inciso I determina que os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, tem legitimidade sucessório, desde que estejam vivas no momento da abertura da sucessão. O inciso II, preceitua que também terão a mesma legitimidade os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que vivas estas ao abrir-se a sucessão. Trata-se da prole eventual.

Mas aqui convém não convém confundir nascituro (inciso I) com prole eventual (inciso II). No Direito Civil, especialmente, no contexto de Direito das Sucessões e Direito de Família, ambos são termos que se referem a situações distintas:

O termo nascituro é utilizado para se referir a um ser humano já concebido, mas que ainda não nasceu, mas é reconhecido como sujeito de direitos, especialmente no que diz respeito a questões de herança e sucessão. Por outro lado, prole eventual se refere a filhos que uma pessoa pode vir a ter no futuro, mas que ainda não nasceram ou não foram concebidos no presente momento. É uma expressão que indica a possibilidade de ter descendentes, mas que ainda não se concretizou.

Em resumo, enquanto “nascituro” se refere a um ser humano já concebido, mas ainda não nascido, “prole eventual” se refere à potencialidade de ter filhos no futuro, sem que estes tenham sido gerados ou concebidos ainda.

Mas há uma importante pergunta a ser feita: e se a prole eventual (beneficiária do testamento) não for concebida? A resposta está registrada no parágrafo 4º, do art. 1.800: “Se, decorridos dois anos após a abertura da sucessão, não for concebido o herdeiro esperado, os bens reservados, salvo disposição em contrário do testador, caberão aos herdeiros legítimos.”

Os já citados Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho,[1] destacam: “Trata-se de um prazo, à primeira vista, bastante razoável, considerando o período de uma gestação, para a consolidação de um patrimônio cuja sucessão ficou pendente de condição (a concepção e o posterior nascimento com vida do beneficiário). Todavia, ampliando os horizontes, talvez tal prazo não seja tão elástico assim, uma vez que não contemplaria, por exemplo, situações de destinação testamentária de bens para filhos de pessoas ainda longe da idade de ter condições para procriar.”

É importante ressaltar que a proteção e os direitos do nascituro são objeto de debates e discussões, especialmente em questões relacionadas ao aborto (tão atual), assistência pré-natal, responsabilidades parentais e sucessão hereditária.

Os legitimados a suceder são os indivíduos que possuem o direito legal de herdar os bens de uma pessoa falecida. Eles são determinados pela legislação vigente e, em geral, estão classificados em duas categorias principais: os herdeiros legítimos e os herdeiros testamentários.

Os herdeiros legítimos são aqueles definidos pela lei como sucessores do falecido na ausência de um testamento válido. Geralmente, são os descendentes (filhos, netos), os ascendentes (pais, avós) e o cônjuge ou companheiro sobrevivente. Essas pessoas são consideradas herdeiras por direito próprio, de acordo com a ordem de vocação hereditária estabelecida pela legislação, que determina quem tem prioridade na sucessão em caso de ausência de disposição testamentária.

A seu turno, os herdeiros testamentários são aqueles beneficiados por um testamento deixado pelo falecido. O testamento é um documento legalmente válido em que o indivíduo expressa sua vontade em relação à destinação de seus bens após o falecimento. Os herdeiros testamentários podem ser pessoas ou entidades designadas pelo testador para receber parte de sua herança de acordo com as instruções contidas no testamento.

É importante ressaltar que a sucessão hereditária pode envolver questões complexas e sensíveis, especialmente quando há disputas entre os herdeiros ou dúvidas sobre a interpretação da vontade do falecido. Nesses casos, é fundamental buscar orientação jurídica especializada para garantir que os direitos dos legitimados a suceder sejam respeitados e que a partilha dos bens seja realizada de acordo com a lei e a vontade do falecido, quando expressa em um testamento.

DIÁLOGO SOBRE A POTENCIAL EXISTÊNCIA DE VOCAÇÃO HEREDITÁRIA AUTÔNOMA NO EMBRIÃO NÃO IMPLANTADO NO ORGANISMO MATERNO E A PROTEÇÃO DOS DIREITOS SUCESSÓRIOS

Essa é uma questão tormentosa que implica um estudo bastante detalhado. Pressupondo-se que a capacidade de suceder, diante do que já feito estudado aqui, exige a existência com vida, questiona-se como ficará a sucessão nos casos em que o embrião, que ainda não foi implantado ou, mesmo implantado, mas após a morte do autor da herança? Teriam ou não o seu direito sucessório protegido, tal qual têm os nascituros?

Antes de tudo, um embrião humano é o estágio inicial do desenvolvimento humano após a fertilização do óvulo pelo espermatozoide. É formado por uma única célula inicial, chamada zigoto, que passa por divisões celulares sucessivas para formar um conjunto de células que se diferenciam em diferentes tecidos e órgãos do corpo humano.

O desenvolvimento humano passa por várias fases, sendo o embrião uma delas. Durante o estágio embrionário, ocorrem processos complexos de multiplicação celular, migração celular, diferenciação e formação de estruturas básicas do corpo.

O embrião humano é caracterizado por ser um organismo em desenvolvimento que ainda não atingiu a fase de feto. Geralmente, o estágio embrionário compreende as primeiras oito semanas de desenvolvimento após a fertilização. Durante esse período, o embrião passa por períodos de desenvolvimento que incluem a formação de camadas germinativas, a diferenciação de tecidos e órgãos, e a formação de estruturas fundamentais, como o tubo neural, que darão origem ao sistema nervoso central.

É importante ressaltar que o embrião humano possui potencial para se desenvolver em um ser humano completo, desde que as condições adequadas sejam fornecidas para seu desenvolvimento contínuo. O embrião é um estágio crítico no ciclo de vida e no processo de reprodução humana, e é objeto de debate em vários contextos, incluindo questões éticas, legais e científicas.

Mas se o embrião for resultado da fertilização in vitro e ainda não implantado no organismo materno, gozará da mesma proteção que o ordenamento jurídico confere ao nascituro? É preciso, contudo, termos uma boa concepção do que vem a ser a chamada “fertilização in vitro”.

A fertilização in vitro (FIV) é um procedimento de reprodução assistida no qual a fertilização ocorre fora do corpo da mulher. Durante o processo de FIV, os óvulos são coletados dos ovários da mulher e fertilizados em laboratório com o esperma do parceiro ou de um doador. Após a fertilização, os embriões resultantes são cultivados por alguns dias em uma incubadora e então um ou mais embriões saudáveis são transferidos para o útero da mulher com o objetivo de estabelecer uma gravidez.

A fertilização in vitro é frequentemente utilizada por casais que têm dificuldade em conceber naturalmente devido a diversos problemas de fertilidade, como bloqueios nas trompas de falópio, baixa contagem de espermatozoides, endometriose, entre outros. Também é uma opção para mulheres que desejam ter filhos mais tarde na vida ou que não conseguiram engravidar por métodos convencionais.

É importante ressaltar que a fertilização in vitro é um procedimento complexo, que envolve várias etapas e requer acompanhamento médico especializado. Os resultados podem variar de acordo com a idade da mulher, a qualidade dos óvulos e espermatozoides, e outros fatores individuais.

Frise-se, também, que tanto óvulos quanto embriões podem ser congelados durante o processo de fertilização in vitro. O congelamento de óvulos e embriões é uma prática comum em clínicas de reprodução assistida e pode ser útil por várias razões:

  1. Preservação da fertilidade: Mulheres que desejam preservar sua fertilidade para o futuro, seja por motivos médicos (como tratamentos de câncer que podem afetar a fertilidade) ou pessoais (como adiar a maternidade), podem optar por congelar seus óvulos para uso posterior.
  2. Transferência de embriões em ciclos futuros: Em alguns casos, embriões excedentes resultantes de um ciclo de FIV podem ser congelados e armazenados para uso futuro. Isso pode ser útil se o primeiro ciclo de FIV não resultar em gravidez ou se o casal decidir ter mais filhos mais tarde.

O congelamento de óvulos e embriões é realizado por meio de um processo chamado criopreservação, no qual são gradualmente resfriados a temperaturas muito baixas para serem armazenados em nitrogênio líquido. Quando desejado, os óvulos ou embriões congelados podem ser descongelados e usados em um procedimento de FIV no futuro.

Mas, os direitos sucessórios do nascituro são estendidos aos embriões? O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADIN nº 3.510/DF, declarou constitucional o art. 5º, da Lei nº 11.105/2005 (Lei de Biossegurança), cuja determinação é a que segue:

“Art. 5º. É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento, atendidas as seguintes condições:

I – sejam embriões inviáveis; ou

II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de congelamento.

Repare-se que o inciso I trata de embriões inviáveis para fins de pesquisas com células-tronco embrionárias e que, segundo o Supremo Tribunal Federal, não violam o direito à vida, nem o princípio da dignidade da pessoa humana.

Porém, e na hipótese de o embrião vir a ser implantado no útero materno após o falecimento do doador do material genético, teria o mesmo tratamento legal, o ser humano daí advindo teria os mesmos direitos sucessórios?

 

[1] Ob. Cit. p. 2.135.